quarta-feira, 16 de setembro de 2015

O Direito que deu errado

 
 
O passado me condena. Ou melhor, me condenou a 14 anos de prisão. Profissional. Mas consegui cumprir a sentença em regime semi-aberto. Não me encontrava totalmente enclausurada, pois tinha o direito de ser eu mesma quando voltava para casa. Algo que a minha labuta diária não permitia, pois ela arbitrariamente me restringia. Me tolhia. Decretos diários como: "_Jamais vá em desencontro com os anseios de um cliente..." ou "_ Você deve alertar, sim. Faz parte do seu trabalho. Agir Direito. E deve fazê-lo com o mínimo de polidez". Faziam parte das audiências cotidianas. E, claro, era imprescindível incorporar a máscara social. Mas eu sentia como se tivesse aprisionada numa burka. Se tem algo que não combina comigo é não ser eu mesma. E esse véu feio e escuro começou a sufocar com o tempo. Se existe algo que não consigo ser, é lobista. Não puxo o saco de ninguém. Quando elogio, é porque realmente gosto, admiro. Senão, me calo. Ia acabar escorregando e me machucando feio se fosse vaselina. Opa. Acaba de soar o alarme da prisão: alguém está querendo fugir dela. Um advogado antissocial que tem crise de consciência? Sei não. Quem viu o esplêndido filme "Advogado do Diabo" interpretado pelo magnífico e teatral Al Pacino, sabe do que estou falando. Mas vamos voltar um pouco no tempo: assim que passei na OAB, posso afirmar que foi o dia mais feliz da minha vida. E assim me senti também, quando resolvi largar o Direito. Não que um dia eu simplesmente decidi abandonar tudo em busca de um sonho infundado. Sou ousada, mas quando o assunto é assumir responsabilidades, sempre tive os pés fincados na razão do chão. Vamos dizer que a crise econômica brasileira em conjunto com a conspiração positiva do Universo me auxiliaram, nesse sentido. Nunca me esqueço do momento em que tive o primeiro insight de que o Direito era errado para mim. Tinha acabado de voltar da lua-de-mel dos sonhos  de qualquer mortal - diretamente da imensidão azul que é o Tahiti. E fui aterrizar - com muita turbulência emocional - no pesadelo que era o meu trabalho (para mim). Uma pausa: não quero parecer a própria "Renata, Ingrata" do Latino. Ganhava bem e o Direito me tornou uma pessoa mais esperta, alerta - em todos os âmbitos. Tenho um radar para farejar falcatruas à distância, graças ao Direito, que me ensinou tudo que existe de incorreto. Dentro e fora da lei. Então voltando a epifania que recaiu sobre mim, estava eu, cabisbaixa, caminhando a passos de tartaruga em direção ao corredor da morte - da minha personalidade - que era o meu trabalho, quando senti um aperto no coração e me perguntei com sinceridade por que eu deveria continuar fazendo algo que me dava tanto desgosto. "_ Pelo dinheiro, lógico!", respondeu francamente a minha consciência. Não me convenceu. Não me comprou.  Então a partir dali passei a mentalizar que o destino estava reservando algo de bom para mim. Que um dia eu conseguiria obter o meu habeas corpus profissional. E, então, numa data qualquer, quando eu menos esperava, o Direito largou do meu pé. Bem dizendo, do meu salto alto. Melhor assim. Prefiro muito mais o meu autêntico e descolado tênis Adidas.

5 comentários:

  1. O Universo conspira e os caminhos se abrem qdo cometemos essa ousadia: ser quem somos!

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  2. Olá Paula querida, muito obrigada pelo seu comentário e por sempre emanar sobre a gente essa sua super energia positiva! :-)

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  3. Rê, adorei o seu texto. Não sabia que você tinha largado o Direito, mas havia percebido que a sua vida tinha tomados rumos diferentes. Como é delicioso este momento não é?! Parabéns pela coragem e pelo texto. Beijos!

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    1. Olá Bruninha, pois é, estou desbravando novos horizontes! E muito feliz! Obrigada pelo incentivo e carinho de sempre!

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