quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Existo para mim


“Penso, logo existo”, assim declarou Descartes. A contrario sensu, se eu não pensar, não existo. Ao menos, para o filósofo iluminista em comento. Quando digo não pensar, significa agir sem ponderar. Então a minha existência passa a ser relativa. Ela é condenada à morte, mesmo eu ainda estando onipresente. Confesso que diversas vezes na minha relativa ou não existência,  simplesmente deu uma enorme vontade de chutar. O balde, o pau da barraca, a bola de futebol americano. Representado todos, a razão. Deu vontade de chutar a razão, quinhentas jardas à minha frente. Touchdown para a Renata! Penso que pessoas que racionalizam demais, agem de menos. Sempre buscam desculpas para não se comportarem, agirem, amarem, de determinada maneira considerada  - aparentemente - fora do âmbito da conveniência social. Parecem mais robôs equipados com chips de emoção programados para serem acionados estritamente de acordo com o disposto no disco rígido e inexorável do seu cérebro. Quadrado. Como um tabuleiro de jogo de xadrez, onde todas as ações são pensadas, sopesadas, prevendo a  próxima jogada do oponente. Até o momento em que uma simples distração os coloca em xeque-mate. Opa. O que fazer nesse momento, em que o seu software se encontra emocionalmente defasado? Putz, eles esqueceram de fazer o download da última versão da teoria da lei universal de que toda ação, gera uma - instantânea - reação. Então surge um bloqueio absoluto que os impede de seguir adiante. Pois não sabem como agir sem ser com base na razão. Como explicar um milagre? Como discorrer sobre a fé? Como acreditar em algo que não se vê? Tudo tão subjetivo, sem embasamento racional. A razão é bacana quando ela anda de mãos dadas com o bom senso: para se levar a vida com o mínimo de razoabilidade. Mas é um saco quando ela acaba sendo sempre a sua única opção de escolha. Pois se torna a porta de entrada de todas as cobranças relativamente existentes: emocionais, físicas, financeiras.  Internas, externas. Existe um padrão estabelecido - intrinsecamente – pela sociedade, a ser seguido. Eu não o vejo. Mas em nome da razão e do bom costume, é assim que eu fui programado para agir. Tenho essa dívida social contraída desde o berço, que devo pagar com juros altíssimos ao Banco Imobiliário do Jogo da Vida. Tem uma música da Alanis Morisette que retrata bem essa situação: se chama “Perfect". Diz que sempre temos que nos esforçar para sermos melhores. Para ganharmos, assim, o amor dos outros. Para as pessoas sentirem orgulho da gente. Não podemos decepcioná-las. Não podemos deixar de ficar, sempre, em primeiro lugar. Uma eterna competição decorrente de um jogo olímpico de vaidades que eu sequer pedi para participar, em primeiro lugar. Em outras palavras, parece que a nossa vida se resume em ter que agradar aos outros. Pensar, para existir – de fato - perante os outros. Se assim for, sou mais agir sem pensar. Viver a felicidade ingênua dos ignorantes. Vejam os bichos: simplesmente agem instintivamente. E sofrem de depressão ou problema de autoestima? Creio que não. Prefiro não existir  para os outros, e mais para mim. Existir, nesse contexto de ter que pensar acima de si, nos outros, implica em persistir, o que te leva, muitas vezes, a desistir. E eu nunca vou desistir de mim. Muito menos para os outros.

2 comentários:

  1. Adorei o texto Rê!
    Perfeita colocação que temos que racionalizar nossas emoções para existir para os outros. Nota 10!

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  2. Cunhadita Lê querida, muito obrigada pelo elogio! :-)

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