Não é todo dia que se acorda na
vibe de um encantador comercial de margarina. Todos à mesa, sorrindo e
degustando, unidos, um delicioso e regado café-da-manhã, digno de resort
de luxo. E é exatamente nesse momento, no qual você acordou com um belo pé
esquerdo, que ele resolve se manifestar com sua total e desenfreada intensidade
– o Lado B. É o setor obscuro da sua personalidade arrancando à força, sem
sua permissão consciente, a blindagem da Doriana. Aquela que te deixa massa, bem atrativa, a la parmegiana. Passada como uma pomada de uso externo, para fingir que – absolutamente sempre – está tudo bem. Afinal, é
tabu falar sobre derrotas. Ninguém gosta de ter testemunhas de
suas fraquezas. Tragam-me vitórias, mesmo que sejam estórias inventadas. Me engana que eu gosto. Traia o meus olhos, sem remorso. O meu Lado A se atrai, sem esforço. Tudo é um utópico, belo
e perfeito paraíso virtual. No estilo ilustrativo de Caetano, deitado sobre uma
rede, deixando a brisa bater na vasta cabeleira, assim, com o semblante dele
declarando placidamente: “_Você é linda. Sabe viver...”. Ah, essa (musa) internet. Sabe realmente viver. Mas, será que efetivamente existe alguém que
consiga ser 100% alegre, 24 horas ao dia? Se houver... Não sei se gostaria de ser
assim. Pensa só não realizar o que é a tristeza? Talvez eu nunca daria valor à legítima
felicidade. O seu filho nasceu? Legal. Fiquei tão feliz com essa notícia como com
o fato de eu ter comprado um rolo de papel higiênico lá na esquina. Passou no
vestibular? Que máximo. Eu escorreguei numa casca de banana, olha que bacana. Ué, se sempre estou ha-ha-ha
rindo à toa, me diga como será possível atribuir um valor diferente, a uma sensação que sempre me é indiferente? Tudo é igual. Pro
bem ou pro mal. Para isso, preciso de parâmetros. E aí é que o Lado B indiretamente
me auxilia nesse sentido. Ele escancara para mim o meu lado agressivo. Impaciente. Egoísta. Antissocial.
Intolerante. Insano. Triste. No entanto, tenta se manter 24 horas com um mau humor danado. De tão
amargo, vai acabar sentindo falta daquele doce comercial de margarina. Já ouvi
falar que embora seja o nosso órgão mais inteligente, o cérebro é
demasiado burro quando se trata em enganar sensações. Tudo se resume a impulsos
nervosos. Então se você declarar impulsivamente que o seu dia está uma tremenda porcaria, dificilmente você sairá da lama. Veja que o seu cérebro acredita
ingenuamente em tudo que você diz a ele. Não questiona. Quem faz isso é o
coração. Sabendo que a verdade não veio à tona, ele detona a sua consciência.
Mas como o coração é de manteiga, acaba te presenteando com as coordenadas da eventual emoção do dia. Você escolhe se vai
optar pelo bom senso, pelo drama, ou pela Doriana. Ah, hoje estou triste sim.
Então assuma. Mas não deixe a despretensiosa tristeza ficar vagando nos seus pensamentos por muito tempo,
pois ela vai acabar convidando a depressão para lhe fazer companhia. Aí
essa temida parceira, vai deixar a sua cabeça com ainda mais asneira. Já, se você começar a
mentalizar que apesar de tudo ter dado errado, uma hora vai ficar tudo bem, é
incrível como o seu cérebro se engana fácil... E passará a se sentir assim
também! É a felicidade instantânea, a la Nissin Miojo. Acompanhada, então, da
Doriana, hum... Mata imediatamente a fome da sua autoestima. Mas, cuidado: é
uma felicidade pobre em nutrientes, e consumida rapidamente. Por isso, seja
Lado A, seja Lado B. Mas, antes de tudo, seja você. Pode-se enganar a todos para sempre. Nunca a si mesmo, por muito tempo.
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